Apresentação ao GT de Transição para a Gestão do Governo Lula 2023 – 2026
Nós, sociedade civil organizada em pleno uso dos nossos direitos, com o intuito de cuidar do nosso país viemos por meio deste sugerir a criação de uma “Política Nacional de Fomento a Ecovilas e Comunidades Regenerativas” no Brasil, tendo em consideração:
CONCEITO
De acordo com a Rede Global de Ecovilas (GEN), que articula o movimento em escala mundial, “uma ecovila é uma comunidade intencional, tradicional ou urbana que é conscientemente projetada em todas as quatro dimensões da sustentabilidade (social, cultural, ecológica e econômica) por meio de processos participativos para regenerar ambientes sociais e naturais" (GEN, 2022a).
Comunidades Regenerativas refere-se a uma diversidade de grupos em movimentos de transição do paradigma da sustentabilidade para o da regeneração. “O objetivo de culturas regenerativas transcende e inclui a sustentabilidade. (...) O design regenerativo cria culturas capazes de contínuas aprendizagens e transformações em resposta, e antecipação, à mudança inevitável. Culturas regenerativas salvaguardam e aumentam a abundância biocultural para as futuras gerações da humanidade e para a vida como um todo” (WAHL, 2019).
ANTECEDENTES
Em 1993 foi criada a 1ª rede de ecovilas na Dinamarca (Danish Ecovillage Network) (BATES, 2003) e em 1995 foi fundada oficialmente a Global Ecovillage Network – GEN (GEN, 2013), hoje alcançando o universo de 10.000 ecovilas em 114 países e em todos os continentes (GEN, 2022b). No Brasil, no ano de 2023 será realizado o 44º Encontro anual de Comunidades Alternativas – ENCA, promovido pela Associação Brasileira de Comunidades Alternativas – ABRASCA, responsável por reunir comunidades intencionais, incluindo as ecovilas, de todo o território nacional durante décadas, tratando-se portanto de um movimento social organizado há mais tempo do que a própria GEN, que atualmente tem o CASA Brasil – Conselho de Assentamentos Sustentáveis da América, representando o movimento mundial de ecovilas no Brasil, sendo também um parceiro institucional da ABRASCA. Estes movimentos e instituições tradicionais, apesar de sua longa e relevante trajetória no país, ainda possuem pouco reconhecimento e representação nas políticas públicas.
CONTEXTO
As ecovilas atendem às demandas de habitação, produção de alimento, e preservação do meio ambiente, constituindo-se como pontes entre o meio urbano e o rural, sendo portanto um modelo de extrema relevância para a regularização fundiária.
Dentre as contribuições das ecovilas, destacam-se: economia solidária; saúde integral; organização social comunitária e participativa; governança democrática e circular eficiente, as escolas de educação consciente, a forma de organização e gestão que privilegia a igualdade de gênero, a geração de renda e trabalho com a floresta em pé, as formas de mediação e solução de conflitos pela paz e inclusão, o desenvolvimento e capacitação técnica em novas tecnologias sociais e ambientais, o desenvolvimento da agricultura regenerativa, o uso de tecnologias limpas, renováveis e de baixo impacto, bem como a adaptação e mitigação à crise climática;
Já em 1998, as Ecovilas figuravam entre as 100 melhores práticas para o desenvolvimento sustentável da ONU-Habitat (MAY, 2018).
Projetos de pesquisa transnacionais recentes destacaram as ecovilas como alavancas de transição mais rápida para a sustentabilidade em parceria com autoridades municipais (GEN, 2022b). Em 2018, o Comitê Econômico e Social Europeu ratificou as ecovilas e comunidades locais como de papel crítico no enfrentamento dos desafios climáticos pela primeira vez (GEN, 2022b).
A Avaliação de Impacto das Ecovilas realizada em 2017 com 30 ecovilas nos cinco continentes comprovou que as ecovilas desempenharam de forma ótima (95% de impacto positivo) nove dos dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030, a saber: ODS 4, 5, 6, 11, 12, 13, 15, 16 e 17 (GEN, 2022a).
O desempenho ambiental das ecovilas brasileiras é superior aos dos municípios nos quais estão localizadas (BELLEZE et al., 2017).
O contexto das mudanças climáticas demanda um esforço global para realizar a transição para economias de baixo carbono, de modo a atender o Acordo de Paris de 2015, do qual o Brasil é signatário. A foto da ecovila de Findhorn ilustra a capa do último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas – IPCC (https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg3/).
Existem 122 ecovilas, comunidades regenerativas e permaculturais distribuídas em 17 estados no Brasil (CASA BRASIL, 2022; GEN, 2022a);
Propostas como essa já vêm sendo implementadas com sucesso em outros países, a exemplo da “Agência Nacional de Ecovilas”, uma política pública desenvolvida no Senegal com auxílio da Alemanha e da França.
Municípios brasileiros como São José dos Campos, Campinas, Campo Limpo Paulista, Boituva e Alto Paraíso de Goiás têm analisado e trabalhado projetos de lei específicos sobre ecovilas de forma conjunta entre sociedade civil e poderes públicos.
PROPOSIÇÕES
O Movimento de Ecovilas e Comunidades Regenerativas do Brasil propõe:
Garantir ao povo brasileiro o cumprimento do Art. 225 da Constituição Federal "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações" por meio do reconhecimento jurídico e institucional das ecovilas e comunidades regenerativas como referências de uso e ocupação sustentável dos solos urbano e rural, integrando-as às legislações nacional, estaduais e municipais pertinentes;
Regulamentar o conceito e definir a caracterização das ecovilas a partir de leis e diretrizes nacionais próprias estabelecendo também os incentivos para a sua implantação e difusão.
A criação de um Conselho e Agência Nacional de Ecovilas para construir essa política, com seus programas e projetos.
A criação de uma Política Nacional de Fomento e Apoio às Ecovilas e Comunidades Regenerativas vinculada ao ministério que melhor couber, podendo ser abraçada pelo Ministério de Desenvolvimento Regional, Meio Ambiente, Cidades ou Agricultura.
Que a Política Nacional de Fomento às Ecovilas seja capaz de produzir modelos de desenvolvimento sustentável que possibilitem uma ocupação planejada e inteligente do território brasileiro, melhorando as condições de vida da população e o desenvolvimento das zonas urbanas-rurais-florestais do nosso país.
Incluir a experiência das ecovilas na criação de soluções à ocupação irregular do solo em área rural e periurbana para garantir o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade rural, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o direito a cidades sustentáveis, democráticas e socialmente justas como parte fundamental do processo de regularização fundiária.
A inclusão na legislação nacional das contribuições feita pelas ecovilas no aprimoramento do Estatuto das Cidades, dos Planos Diretores Municipais e no Planejamento Territorial nos espaços rurais e regionais.
A incorporação da experiência das ecovilas no aprimoramento do Plano de Manejo das Unidades de Conservação (UC) e demais áreas de proteção ambiental;
Executar políticas públicas que contribuam na transição das vilas atuais em futuras ecovilas e a transformação de bairros em ecobairros;
A incorporação progressiva de tecnologias sustentáveis nas pequenas e grandes cidades visando diminuir o impacto negativo delas ao meio ambiente;
Organizar Conferências Municipais, Estaduais e Nacionais de Ecovilas visando estimular a participação democrática e plural dessa nova política nacional e elaboração de Planos Municipais, Estaduais e Nacionais de Ecovilas;
A adoção das tecnologias e metodologias das ecovilas para mitigação, prevenção e adaptação às mudanças climáticas.
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